Vivemos uma era de acesso quase ilimitado à informação, mas, paradoxalmente, de profunda escassez de discernimento. No campo do espiritualismo, esse paradoxo se evidencia com ainda mais força. O Brasil, país reconhecidamente aberto às experiências espirituais, abriga uma vasta gama de práticas, crenças, linhas filosóficas e religiosas que, embora plurais, compartilham uma base comum: a crença na reencarnação, no karma, nas experiências fora do corpo e nas bioenergias. No entanto, essa abertura, embora potencialmente enriquecedora, tem sido acompanhada por uma diluição preocupante de conteúdo, sentido e profundidade.
O termo “espiritualismo” não se restringe a uma doutrina específica. Ele abarca uma multidão de expressões que vão desde o espiritismo kardecista até a Umbanda, do Candomblé às escolas esotéricas, da gnose à teosofia, da Conscienciologia à Apometria, passando por grupos místicos, terapeutas holísticos e buscadores autodidatas. Todos esses caminhos compartilham a negação do materialismo absoluto e o reconhecimento da consciência como princípio organizador da vida.
Essa diversidade é uma riqueza, mas também um desafio: como manter o eixo ético, cosmoético e consciencial, diante de tantas vertentes que se multiplicam, muitas vezes sem a devida responsabilidade doutrinária, científica ou filosófica?
Nos últimos anos, assistimos a uma profunda transformação do espiritualismo brasileiro, especialmente nas camadas de classe média — que são as maiores consumidoras de conteúdos espiritualistas. Muitas dessas pessoas, movidas por anseios legítimos de sentido e superação, foram atraídas por uma versão “soft” do espiritualismo: descompromissada, agradável, cheia de palavras bonitas e técnicas milagrosas. Contudo, essa leveza, quando não sustentada por coerência e aprofundamento, facilmente degenera em superficialidade.
A espiritualidade virou estilo de vida. Tornou-se um produto, uma marca, um nicho de mercado. Muitos que se intitulam mestres da prosperidade, gurus de rede social e terapeutas da nova era estão mais preocupados com seguidores e faturamento, do que com a verdadeira transformação da consciência. O que antes era busca sincera de autoconhecimento e transcendência virou um palco para egos inflados e receitas instantâneas.
Ferramentas espirituais sérias, como o Ho’oponopono, o Reiki, o ThetaHealing, a Cura Prânica, a EFT, o EV (Estado Vibracional), os estudos dos chacras e até práticas ancestrais de magia branca, passaram a ser exploradas como panaceias universais ou gatilhos para enriquecimento pessoal. Usadas fora de contexto, desprovidas de iniciação, estudo ou acompanhamento, essas práticas perderam seu centro, sua ética e sua direção evolutiva.
A lógica subjacente a esse uso é a mesma da indústria farmacêutica: algo que serve para tudo, no fundo, não serve para nada. Em vez de ajudar no desatamento dos nós kármicos e na integração lúcida da consciência, as técnicas acabam reforçando o ego, a fantasia e o consumismo espiritual. O espiritualismo, nesse modelo, torna-se apenas uma fachada — uma maquiagem transcendental para esconder angústias que pedem enfrentamento, não sedação.
Dentro desse cenário, um dos modismos mais sedutores é o espiritualismo da prosperidade. Ele afirma que, com afirmações positivas, mentalizações e manipulação energética, qualquer um pode “atrair abundância”. Em tese, trata-se de uma premissa legítima: somos cocriadores da realidade e o universo responde às nossas vibrações. Mas, na prática, o discurso se distorce.
A prosperidade torna-se um fim em si mesma, desconectada de propósitos evolutivos, de retificações kármicas e da ética universal. Nessa lógica, ser rico é sinônimo de ser espiritualizado, e as dificuldades financeiras seriam sempre fruto de “bloqueios” ou “crenças limitantes” — nunca de escolhas mal feitas, karma coletivo, pessoal ou missão de vida pré-programada. Tal visão ignora as complexidades do karma e reduz a vida a um jogo de “pensamento positivo”.
No paradigma consciencial, toda experiência é relativa à trajetória da consciência. Não há bem ou mal absolutos, mas há coerência ou incoerência com as leis evolutivas. A cosmoética é o eixo que deve nortear todas as práticas espiritualistas. E isso implica discernimento, responsabilidade e autocrítica.
A abertura espiritual do povo brasileiro é, sem dúvida, um ponto forte de sua cultura. Mas essa abertura precisa ser acompanhada de filtros críticos, estudos sérios e práticas vivenciadas com lucidez. Do contrário, abre-se espaço para crendices, modismos e práticas descompensadas que mais alimentam ilusões do que promovem iluminação.
O verdadeiro espiritualismo não pode ser confundido com consumo espiritual. Ele exige enraizamento nas leis do karma, compreensão da reencarnação, domínio das bioenergias e, sobretudo, vivência da ética consciencial. As técnicas são ferramentas — não fins. Mestres verdadeiros não vendem atalhos, mas apontam trilhas. A prosperidade é um aspecto legítimo da vida, mas deve vir como consequência de coerência e não como objetivo egocêntrico.
A espiritualidade autêntica pede profundidade, constância, estudo, prática e desapego. Pede que a consciência compreenda sua história kármica, seus padrões emocionais, seus vínculos e suas responsabilidades. É hora de devolver densidade ao espiritualismo. De sair da superfície para o centro. De trocar a moda pela verdade. De abandonar o palco e assumir o altar interno. De deixar de ser apenas simpatizante e tornar-se um praticante sério do bem, do belo, do justo — e do verdadeiro.

Dalton é escritor, poeta, cronista, contista, jornalista do astral, médium e humorista incorrigível da consciência. Sente uma saudade imensa de seu planeta em Sírius B e está ansioso para ser “puxado” pelo planeta Chupão. Ele alega com bom humor: “Não quero ficar com os ‘evoluídos’.” Autor de dezenas de obras independentes, sendo 5 sobre informática, uma sobre autopublicação, humor, música, o resto sobre sobre espiritualidade e consciência, mas sem religião. Engenheiro Civil, pós-graduado em Educação em Valores Humanos (inspirado em Sathya Sai Baba) e Estudos da Consciência com ênfase em Parapsicologia. E, como ele sempre diz: “Me ame quando eu menos merecer, pois é quando mais preciso.”
Livros impressos – https://livros.consciencial.org
E-books – https://ebook.consciencial.org/
Cursos, áudios, meditações, práticas – https://cursos.consciencial.org
Seu livro publicado – https://seulivropublicado.com.br
Ao comentar em qualquer post, você concorda com nossos termos, assume e aceita receber nossos comunicados de ofertas, promoções e mensagens automaticamente. Se não concordar, não comente, respeitamos a LGPD. ***